Por Eduardo Passold Reis
Alvíssaras! Boa nova! Grande notícia!!!
As exclamações me vieram prontas à mente quando recebi a mensagem: surge a publicação on-line Summum Iuris, capitaneada pelos preclaros Doutores Romano José Enzweiller e Claudia Galiberne Ferreira, com apoio técnico do jovem Heitor.
Novos ventos surgem a partir do trabalho incansável e constante – mas discreto, sem deselegantes arroubos – do casal que já muito engrandeceu a cultura jurídica catarinense, com obras jurídicas e artigos científicos de elevado valor. Vem a público, agora, o germinar de um importante ideal: a difusão de textos, artigos, crônicas e resenhas de conteúdo jurídico e cultural através de um site, alocado na rede mundial de computadores pelo domínio: www.summumiuris.com.br
Saudamos, com admiração e alegria, os albores destes tempos novos. A difusão de conteúdo jurídico e cultural de qualidade é urgente. Pela falta de uma condução austera e circunspecta, tem falhado os ideais de uma formação sólida na Universidade brasileira. Nada mais verdadeiro se enxerga ao olharmos hoje para a formação jurídica do País. Multiplicam-se as faculdades, os cursinhos, e formam-se um sem-número de novos bacharéis todos os anos. Mas o devotamento a seriedade do ensino jurídico parece passar ao largo. A compreensão do Complexo, o pensar zetético e teleológico, o esmero na formação pessoal, a disciplina no crescimento intelectual e profissional não parecem ser mais questão de primeira necessidade, infelizmente. No mais, os bacharéis recém-formados no campo do Direito parecem, em Processo, algo como semi-praxistas, despachantes ou, como se dizia ao tempo antigo, “práticos”, ao copiar e colar modelos prontos disponíveis na Internet; em Direito Privado, alimentam-se das migalhas confusas que lhes vendem algum curso preparatório que confunde autores tão divergentes como Cláudia Lima Marques e Luciano Benetti Timm. Isso, se ouviram falar deles – por certo, dois dos maiores autores em Direito Privado do Brasil na contemporaneidade. Em Direito Penal – ou em direito sancionador e disciplinar, em geral – aprendem que “tudo depende” e quein dubio pro reo. Há algo além disso?
José Renato Nalini (Ética Geral e profissional, 9ª edição, São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012,pp. 445 e ss.) apresentou sincero – e preocupante – quadro acerca do tema:
“O resultado do baixo aproveitamento do ensino jurídico é o adensamento da legião de bacharéis desiludidos. Cursar direito é tranquilo e não requer esforço algum. Os cinco anos da faculdade são alegres, puro deleite. O único problema é o sexto ano. Agora já não há o apelo ao professor para melhorar a nota, para suprir as faltas, para obter a dilatação de prazo, nunca fatal durante o curso. O compromisso do formado é com sua vida. (…) Aqueles que não assumiram o compromisso de extrair do curso jurídico todas as suas potencialidades encontrarão todas as portas cerradas. Não conseguirão ultrapassar a barreira do Exame de Ordem. Nunca obterão êxito nos concursos públicos, cada vez mais disputados. Continuarão a fazer o que sempre fizeram e com uma diferença. Sentir-se-ão frustrados, pois os investimentos durante os cinco anos para nada lhes serviu. (…) A opção por um aprendizado sem seriedade e sem sacrifício importará em consequências desastrosas. Pior, os efeitos não tardarão a ser sentidos pelo próprio aluno. (…) A figura do aquário é sugestiva. Apenas um peixe ornamental é pouco. Dois sobrevivem. Com três, pode haver algum conflito. Povoe-se o mesmo aquário com milhões de peixes e haverá o sacrifício dos menos capazes. O canibalismo será a regra e poucos sobreviverão”.
Olhando pelas mesmas lentes do jurista paulista, preocupa-me o mundo real, vivido e não o de um tempo pós-apocalíptico. Essa não é a “nobody´s land” da série cinematográfica Mad Max. Não é pessimismo kierkgaardiano. É um realismo cru. E diante dele, rogo que os juristas realistas estejam errados, porque, respondam-nos, discípulos do Professor Alf Ross, o que pode proceder a partir do que temos diante de nossos olhos? O que seguirá ao Direito que legamos a esta geração? O que virá adiante?
A iniciativa de Claudia e Romano vem auxiliar a aviventar rumos, suprir lacunas, sanar falhas, reparar erros, incitar a um renovo no pensamento jurídico e cultural. O espaço organizado certamente será bem usado para o desenvolvimento de estudos sérios e para divulgação de ideias que procurem edificar a geração jurídica presente – na qual me incluo – tão carente de vetores e raízes, que recordam o dito do profeta veterotestamentário – “Achadas as tuas palavras, logo as comi; e elas foram gozo e alegria para meu coração” ( Jeremias 15:16).
Volver ao estudo sério e e dedicado, a práticas metodológicas austeras, e a uma firme compreensão do que se espera dos juristas nesta e nas próximas gerações: uma responsabilidade esta a que Claudia e Romano não se furtaram, como se vê. O Direito não é nem nunca foi fácil e quem o enxerga assim, ou ainda não o compreendeu, ou deveria fazer outra coisa, porque de facilidades, “macetinhos” e praxismos vazios não se constrói uma Ciência a que se apresentam tantos desafios na pós-modernidade.
Eduardo Passold Reis é magistrado em Curitibanos, na serra catarinense e mestrando da Universidade Federal de Santa Catarina.